Rio de Janeiro, RJ, 1983.
Vive e trabalha no Rio de Janeiro, RJ.
Aos 12 anos já frequentava a Escola de Artes Visuais Parque Lage. Por ter sido criada dentro de um ambiente familiar difícil por seu pai e avó, tendo sua mãe ausente por transtornos mentais, a artista encontrou através da arte e convívio dentro da Escola de Artes Visuais um objetivo e foco de vida. Sua produção artística questiona o patrimônio ancestral e socioambiental dos povos da floresta, a defesa contra a violação ao corpo feminino, tencionando as estruturas sociais e políticas da nossa sociedade.
Gabriela se insere em uma tradição de exploração dos limites e possibilidade da gravura, com nomes como Fayga Ostrower, Anna Letycia, Anna Maria Maiolino, Anna Bella Geiger e Leya Mira Brander, para citar algumas. Formada em Gravura pela Escola de Belas Artes da UFRJ em 2007, a artista vem estruturando sua poética a partir do interesse pela imagem técnica construída a partir de vídeos, fotografias e, mais inicialmente, a gravura, e pela ideia de fixar uma imagem no tempo.
Máquina do tempo
Por Raphael Fonseca
Reprodução, citação, apropriação – muitas seriam as palavras possíveis para o universo poético de Gabriela Noujaim. Outro termo, trabalhado pelo historiador da arte Hal Foster, parece mais adequado: recodificação. O ato da “reprodutibilidade técnica” surge em seus trabalhos não apenas como um meio de fazer lembrar as tradições da história da arte e da cultura, mas com a potência de se criar uma nova narrativa a partir de imagens icônicas.
Uma câmera anônima captura o movimento da natureza sobre o ar. Qual a finalidade primeira desse registro? Lembranças de uma viagem? Um estudo de zoologia? Um álbum privado de memórias transformado em um canal público de vídeos na world wide web? Em “Céu e mar”, um aquário transforma este registro num panorama da paisagem. Se a fotografia já foi chamada de câmara escura, é uma “câmara transparente” o suporte da videoinstalação. Esta violenta revoada de pássaros ecoa a perspicácia matemática de Escher. O econômico volume d’água dentro do recipiente se transforma em um lago que reflete e distorce a ação. Este parece ser um verbo crucial na produção da artista: “distorcer”, usar imagens e proporcionar interpretações futuras que estão além da literalidade.
Em “O ovo da serpente”, o cinema é desprovido de seu movimento e frames são projetados no espaço expositivo. A potência da horizontalidade é perpetuada, mas estes rostos decupados por Bergman recebem uma camada mais fantasmática do que a originária. O ovo pode ser da serpente, mas é uma fita de Moebius que está à frente de sua ampliação. Para além de uma figura geométrica, esta imagem faz lembrar da vinda de Max Bill ao Brasil e de sua importância para a reverberação da arte concreta (e neoconcreta futuramente). Menos palpável que a história da arte, a mitologia antiga e o símbolo do ouroboros: o eterno retorno, início e fim conectados.
Pensando junto às obras de Gabriela Noujaim, a imagem da serpente que morde o próprio rabo e a necessidade de se olhar para trás para se produzir a arte de hoje. Passado, presente e futuro são problematizados dentro de uma pesquisa artística que tem a gravura, a fotografia e o vídeo, ou seja, a imagem técnica, como máquina do tempo.
LATINAMERICA
Por Sissa de Assis Curadora
A exposição individual LATINAMERICA – Gabriela Noujaim é o desdobramento do livro de artista Latinamerica (2020), obra que inspirou o conceito desta exposição. A artista contemporânea Gabriela Noujaim (1983-) trabalha e reside no Rio de Janeiro, iniciou sua carreira artística no sistema de arte nacional há mais de dez anos, participando de exposições coletivas, individuais e bienais internacionais.
Nesta exposição contamos com obras que formam um rizoma, sendo consideradas extensão da constelação imagética e textual que o livro de artista apresenta. Este traz em seu bojo reflexões sobre a situação social, emocional e profissional de mulheres brasileiras que perpassam no contexto da pandemia. A artista almejou conexão e afetividade convidando mulheres do Brasil para serem protagonistas da construção deste livro, reconhecendo que a afinidade de gênero é pilar desta obra coletiva.
Para tanto, Noujaim registrou seus relatos de vida pessoal e profissional durante o isolamento social dessas mulheres, mas ofereceu escuta afetuosa, acolhimento e resistência em tempos de crescente violência contra as mulheres. Por extensão, abrigou-as entre as obras que compõem o livro ensejando mais um capítulo da história da mulher latino-americana.
A exposição do livro de artista completa-se no universo de obras escolhidas que orbitarão em torno do percurso do olhar dos/das visitantes que serão orientadas/ os no espaço expositivo, para viver a experiência de folhear o livro de artista, encontrar obras ocultas, interligá-las com as demais obras e, principalmente, repensar a nossa situação de emergência pela vida. Assim como, serão convidadas/os para expandir seu percurso presencial pelo ambiente virtual usando dispositivos pessoais com acesso à internet. Por fim, tal concepção de exposição híbrida que transita entre os espaços físico, virtual e mental é nosso convite à aventura da reflexão crítica – pedra de toque desta proposta de exposição – durante este habitar temporário e presencial no Museu Nacional da República.
Mais Textos