Rio de Janeiro, RJ, 1986.
Vive e trabalha no Rio de Janeiro, RJ.
Formado em design de moda pela Universidade Veiga de Almeida (2007), Rio de Janeiro, o artista se dedica ao desenho em suas múltiplas acepções. Suas últimas obras conciliam pintura, desenho e costura em peças de tecido sem forma definida. Entre 2007 e 2016, participou de exposições na Casa França Brasil, Rio de Janeiro; na The School for Curatorial Studies, Veneza; na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio de Janeiro, e no Ateliê Subterrânea, Porto Alegre. Atualmente, é professor do curso Procedência e Propriedade no Ateliê Novo Mundo, Rio de Janeiro.
Formado em design de moda pela Universidade Veiga de Almeida (2007), Rio de Janeiro, o artista se dedica ao desenho em suas múltiplas acepções. Suas últimas obras conciliam pintura, desenho e costura em peças de tecido sem forma definida. Entre 2007 e 2016, participou de exposições na Casa França Brasil, Rio de Janeiro; na The School for Curatorial Studies, Veneza; na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio de Janeiro, e no Ateliê Subterrânea, Porto Alegre. Atualmente, é professor do curso Procedência e Propriedade no Ateliê Novo Mundo, Rio de Janeiro.
O trabalho de Arthur Chaves parte do desenho, na sua acepção mais estrita. Amplia o artista seu sentido, contudo, à medida que o considera não mais na qualidade de técnica de representação ou segundo os materiais que tradicionalmente o determinam, mas sobretudo como uma disposição especial à observação, contemplativa e transfiguradora. Para tanto, Chaves faz uso inicialmente dos recursos convencionais do desenho na atividade infinda de contemplação daquilo que se lhe apresenta imediatamente; mas não só.
Segundo o curso que segue seu gesto, o artista compreende os acidentes a que está sempre sujeito: aqueles que se acumulam segundo uma lógica inescrutável e contingente, e que prestam corpo àquilo que até então se configurou historicamente como mera representação. Põe em cheque, portanto, o convencionalismo sobre o qual se assenta o entendimento ainda corrente sobre desenho.
O artista compreende, segundo o curso que segue seu gesto, os acidentes a que está sempre sujeito; aqueles os quais se acumulam segundo uma lógica inescrutável e contingente, e que emprestam corpo àquilo que até então se configurou historicamente como mera representação. Põe em xeque portanto o convencionalismo sobre o qual se assenta o entendimento ainda corrente sobre desenho, em consonância com a atitude crítica-reflexiva promulgada nos idos da arte moderna. Em poucas palavras, no universo habitado por Chaves, ao desenho enquanto momento de intensificação da presença observadora, não cabe mais a conformação a métodos ou sintaxe pré-concebidos.
Em meio a outros fatores, essa ampliação do sentido conferido ao desenhar é responsável pelo deslocamento do plano de investigação do artista na direção de estruturas à primeira vista amorfas, constituídas por tecidos de procedência diversa, adulterados segundo as regras de uma vontade de ver permanentemente insatisfeita e das interferências cegas e erráticas das mãos, que se furtam a esquemas explicativos de natureza conceitual ou narrativa.
Nesse sentido, o desenho de peças – que, acordo com as leis de sua dinâmica interna, ao olhar atento multiplicam suas figuras – se determina não mais pelo desejo de oferecer um representante ao motivo original do desenho – se ao menos existente –, mas ser um desenho e seu motivo, dotado de autonomia suficiente para se impor a nós nos espaços dos quais se apodera. Dizemos, portanto, tratar-se, paradoxalmente, de obras autodeterminadas, já muito distantes de qualquer atitude protocolar diante daqueles que vêem. Ainda se nos é permitido dizer, trazem no corpo os desenhos os elementos constituintes de uma atmosfera – inefável por natureza, aversa a qualquer tematização –, com poder para deformar as próprias condições espaciais de sua existência.
Felipe Kaizer é designer e pesquisador. Seus interesses variam da filosofia política tradicional às teorias contemporâneas da arte. Graduou-se pela PUC-Rio em 2006 e participou entre 2009 e 2015 do estabelecimento da equipe interna de comunicação da Fundação Bienal de São Paulo.
Recolhendo sobras
Agnaldo Farias
A trilha poética de Arthur Chaves está assentada na ambiguidade, no que a primeira vista assemelha-se a uma indecisão, posto que não se sabe ao certo se cada um de seus trabalhos, a maioria situada entre a pintura e a escultura, está a meio caminho do próprio fim ou, em estado larvar, apenas começam a se constituir. Das duas, uma: ou bem estão se desfazendo ou, ao contrário, a intenção do artista será organizá-los em construções mais limpas, escorreitas. Quem sabe?
Pois nem um nem outro. Por um lado parecem mesmo um tanto desfeitos, em virtude de serem compostos por pedaços de matéria no geral dócil, como tecidos e plásticos variados, alguns moles outros mais rígidos, como é próprio das sobras de produtos, dejetos industriais, em suma, coisas que se prestam à manipulação com relativa facilidade. Esse sentimento é tão forte a que simples visão de um conjunto deles, como este ora em exposição, pode lembrar um agrupamento de estandartes composto de matéria maltrapilha, acumulada, empilhada e alinhavada, precariamente apoiada em pregos, parcialmente retesadas em molduras, ou arranjadas em traves de madeiras, estruturas de ferro, tudo meio desconchavado.
Mas essa impressão desfaz-se em seguida, com a vista aproximada, a percepção de que os trabalhos nascem do arranjo cuidadoso entre padrões estampados, planos coloridos, imagens impressas, notícias de um mundo repleto de informação, engatados uns aos outros, sobrepostos em camadas despejando-se em quedas suaves ou dramáticas, pendendo em catenárias, resultante dos pesos próprios de cada uma das peças, de seus formatos irregulares, cheios de pontas, dobras, reentrâncias, frequentemente incorporando a parede que lhe deveria servir apenas como apoio. Aproximando-se ainda mais, as costuras se revelam, as linhas minúsculas e exatas produzidas pela mecânica minuciosa de uma máquina de costura, equipamento que o artista maneja com perícia. É possível imaginá-lo debruçado sobre o equipamento cuidando em juntar partes que em princípio não se adequam, quase que incompatíveis. E é bem provável que trabalhando assim no miúdo ele perca a noção do todo, o que faz que cada peça seja um resultado não previamente projetado. Um resultado que se obtém mediante a inteligência das mãos, em associação com materiais e equipamento. Em coerência com esse processo, as superfícies de suas obras são sempre baças, misteriosas, debaixo delas vêm uma carrada de elementos, imagens, cifras, outros signos; a matéria que corre como a que chega levada pela correnteza da água das sarjetas, o escoar contínuo pelo chão das arquiteturas desabitadas de Stalker, o inesquecível filme de Tarkovsky, levando consigo fragmentos indiscerníveis.
Com sua infância passada numa cidade pequena, Arthur Chaves veio para o Rio de Janeiro para fazer o curso de moda. Sua habilidade levou-o a trabalhar como assistente de diversos artistas, alguns deles, como Daniel Senise e Cadu, acreditando e impulsionando o evidente talento do jovem artista. O grande risco contido numa vivência como essa, no interior de estúdios de artistas senhores de sua linguagem, é que ela pode levar a alguém em formação a ter como seu os caminhos dos outros, incorporando soluções e rotinas. Nada disso contagiou nosso artista que deles, quando muito, aproveitou as sobras de suas oficinas. Isso porque a matéria prima de Arthur são as sobras, que de resto é o que mais se produz no mundo todo. Aquilo que é descartado, que tem por destino o anonimato do lixo, o que demonstra o pouco caso pelo tanto que ele carrega de memória e energia vital, é o que o nosso artista recolhe, reorganiza e, agora como um corpo pulsante, coloca diante de nós.