(ultima atualização em março/2023)
Uberaba, MG, 1969.
Vive e trabalha em São Paulo, SP.
Representada pela galeria Marcelo Guarnieri.
Vencedora do PIPA Online 2010.
Indicada ao PIPA 2014.
Obras na coleção do Instituto PIPA
Site: anapaulaoliveira.art.br
Vídeo produzido pela Matrioska Filmes com exclusividade para o PIPA 2014:
Quase ao alcance das mãos
Por Rodrigo Naves, 2012
Na mitologia grega, Anteu, filho de Posêidon e Gaia, era um gigante que extraía sua força descomunal do contato com a Terra/Gaia, sua mãe. Tão logo deixasse de tocá-la, via seu vigor reduzir-se. E foi assim, alçando-o do chão, que Hércules o matou. Em muitos dos seus trabalhos, Ana Paula Oliveira realiza um procedimento oposto. A artista costuma usar estacas ou cunhas de madeira para elevar ou sustentar coisas e animais e, desse modo, reforçar sua presença. Podem ser os peixes de “Instável” (2012), a borracha de “Iminente” (2009) ou o estrado de “Diadema” (2003). Pouco importa. A inteligência do trabalho consiste justamente em pô-los numa situação estranha à sua posição natural e com isso torná-los mais visíveis, potentes e perigosos. E o interessante é que, a cada novo trabalho, Ana Paula consegue chegar a significados diversos, ainda que seus procedimentos não mudem radicalmente.
O atual trabalho, “Meu chapéu tá no alto do céu”, tem algo dos quintais da infância e por isso as jabuticabeiras precisam ser alçadas, com raízes e tudo. A mudança de escala das árvores foi necessária para nos devolver o tamanho que tínhamos no tempo em que um pé de fruta reparava todas as injustiças do mundo. E o Beco do Pinto, bem no centro desta cidade de poucos quintais, foi a alternativa que lhe restou.
Mas por que alçá-las de maneira meio rude, usando dormentes já carcomidos pelo tempo, desproporcionais ao peso que sustentam? Acredito que, em parte, essa escolha se explica literalmente: erguidas de maneira algo brutal pelos dormentes, as jabuticabeiras se mostram desterradas. As alegrias da infância não podem ser mais resgatadas. Resta apenas restituir-lhes uma imponência perdida. Distribuídas pelos diversos patamares da ladeira, as árvores parecem cumprir um ritual religioso: pagar a promessa que leva os fieis a lanhar os joelhos em nome da salvação. E então a leveza da infância se vê transformada na triste religiosidade das cidades do interior.
Mas não é da arte de Ana Paula reclamar das mazelas do mundo. Ao contrário. Seu trabalho fala da possibilidade de revigorar antigos significados, de reconquistar vitalidade para aquilo que o hábito velou. E então as bolsas com água, das quais correm os tubos que irrigam as jabuticabeiras, restituem às velhas rezadeiras uma vitalidade nova. Cedendo à lei da gravidade, a água inverte a direção da ladeira, transforma-a em descida e leveza. E, numa fração de segundo, as jabuticabeiras já ensaiam os passos de uma dança que as torna simultaneamente feiticeiras e dançarinas, as galhadas estendidas para o alto, livres momentaneamente das raízes que as fixam ao chão.
Eu também já tive quintal e foi nele que realizei minhas poucas façanhas. Com essa obra, Ana Paula Oliveira foi bem mais longe. À doçura generosa da natureza vêm se misturar fantasias que não sabíamos nomear e que pertenciam também a uma outra natureza, talvez menos gentil que a das árvores: calores desconhecidos, desejos sem objeto, tardes quentes de preguiça e inquietação. Dançarinas e feiticeiras.
Jabuticabeiras têm algo da Cocanha, o país imaginário da fartura e do ócio. Coladas ao tronco, ao alcance da mão, centenas de frutos nos garantem que podemos ter calma, pois há alimento para todos. E então, num passe de mágica, tudo se distancia: árvores, bonança, descanso. Apenas para reluzirem como nunca reluziram antes*.
*Este artigo é dedicado a minha amiga Júlia Abs, que me ensinou a ver a dança.
Lé sem lé, cré sem cré (tomara que o mundo acabe)
Por Nuno Ramos, 2009
O trabalho de Ana Paula Oliveira não junta. Isso é o principal. Ele desconjunta, distrai, absorve, rasga, cai. Mas não junta. O galo de Alvorada (2004) não sabe nada do sabão. Os pássaros de Um gato um pintassilgo as estrelas(2007) não sabem nada da borracha. Uma parte não sabe nada da outra. Há uma distopia pairando, não um contraste. O diferente junta, o disparate junta, o que é oposto junta. Mas o trablaho de Ana Paula não junta, e por isso que surpreende tanto.
Essa é sua intuição principal, como mendigos fazendo discursos uns ao lado dos outros, indiferentes à mútua companhia; como atletas correndo provas separadas numa mesma raia. Algo arbitrário ronda, portanto, estas peças, necessariamente. è o arbítrio que as fez assim – arbítrio mesmo, distraído, estético. E se são tão mal acabadas, se quase desabam, se mal se sustentam em seus apoios, é para que essa indiferença entre as partes possa manter-se viva, sem fixação. Parecem, muitas vezes, ter sofrido uma pancada, mas a violência que vem delas, que aparece nelas, perceptível ao nosso olhar, é apenas secundária, embora estruturante. A verdadeira violência, primária, veio do ato mesmo de colocá-las ali, como uma cópula sem penetração, rondando, tentando. Por isso os passarinhos de Dos pássaros pareciam tão aflitos, voando por toda parte, como uma nuvem bíblica de gafanhotos e nao canarinhos de gaiola. A quem pertenciam? A si mesmos? às esculturas da parede? A revoada emotia a pergunta sem descanso.No final, pareciam livres da obrigação de simbolizar, descarregados de si próprios, afastados enfim da doce identidade que têm os passarinhos de gaiola. Algo terrível nascera neles.
Em um dos trabalhos desta exposição, Ainda não, o peso de dormentes excessivamente dimensionados (como tambémem elefante, em 2009)apóia reservatórios de plástico com água e peixes vivos. A vida que vai dentro dos sacos é absurda, rondando, quase morrendo, comprimida demais, numa estrutura de madeira e sacos plásticos que tem pouco a ver com ela.As duas são tão alheias que parecem afinal estabilizar-se, esvaziando-se mutuamente, numa espécie de destroço involuntário que ninguém sabe bem como foi parar ali, daquele jeito. Os dormentes apenas apoiados, os sacos quase estourando sob o próprio peso, a falta de oxigenação dos peixes, a precariedade final que ronda tudo, formam a encarnação, a matéria da intuição poética de Ana Paula Oliveira, pondoem conexão aberta, transitiva, os elementos chamados ao palco. Eles devem manter-se exatamente assim, quase insustentáveis, para que não sirvam uns aos outros. Por isso os dormentes são tão grandes – sustentam mais o próprio peso do que aquilo que carregam. Dessa forma, a intuição poética de todo o trabalho – aproximar sem interagir; chorar sem carpir; abraçar sem fundir; tocar sem sentir; penetrar sem procriar, numa fuga sem trégua ao terceiro termo, ao resultado da operação contrastante-, pode manter-se intocada.
Acho que o problema de Ana Paula de agora em diante será desenvolver esta intuição mergulhando na linguagem, nas possibilidades da linguagem, mas sem perder a carga disjuntiva. Trata-se afinal, de uma pequeno paradoxo – fazer arte é sempre, de alguma forma, produzir linguagem (se deixamos de lado, uma vezinha só, essa panacéia contemporânea em que se tranformou o binômio arte-vida), mas , neste caso, sem juntar bem sujeito e predicado. No entanto, não há artista verdadeiro que não mergulhe no espelho do que fez, que não aprofunde sua potência diante do que elegeu como signo. Essa potência é, já de saída, de alguma forma articuladora, com sua rede de possíveis traduzidos, conectados pela própria obra. Para desenvolver-se, o trabalho de Ana Paula terá de reconhecer-se cada vez em seu próprio estranhamento, mas sem enfraquec~e-lo, sem deixar que a própria sintaxe plástica dê coesão ao que devia permanecer desconexo. Acredito que o segundo trabaho desta exposição, Contrapássaro, geométrico e literalmente aquilibrado, é um exemplo de sucesso nessa nova etapa – há ali uma articulação entre partes que tem nitidez inédita, mas que não falseia o contorno estilístico da obra.
Por isso, quando olharmos estes trabalhos 9 por mais que o saco esteja bem costurado, por mais que a chapa esteja equilibrada, por mais que o peixe solte bolhas de ar plea boca), será preciso prestar atenção ao sussurro que vem deles: tomara que o saco rasgue, tomara que a chapa caia; tomara que o peixe morra. E mais baixo ainda, numa voz bem fininha: tomara que o mundo acabe.
Exposições individuais
2016
– “Círculo de giz e um pouco sobre sólidos”, Galeria Marcelo Guarnieri, São Paulo, SP
2015
– “Vai que Vai”, Paço das Artes, São Paulo, SP
2013
– “Ainda que te vi”, Galeria Millan, São Paulo, SP
2012
– “Meu chapéu lá no alto do Céu”, Beco do Pinto/ Museu da Cidade de São Paulo, SP
2009
– “Ainda Não e Contrapássaro”, Galeria Virgilio, São Paulo, SP
2007
– “Um gato um pintassilgo e as estrelas”, Galeria Virgilio, São Paulo, SP
2005
– “CERCA”, Atelie 397, São Paulo, SP
– “Segurado e Pau de Fitas”, Galeria Virgilio, São Paulo, SP
2003
– “Alvorada minha Terra”, 10,20×3,60, São Paulo, SP
– “Diadema”, CEUMA – Centro Universitario Mariantonia, São Paulo, SP
2002
– Mostra de exposições CCSP – Centro Cultural São Paulo, Prêmio aquisitivo, São Paulo, SP
2001
– “Soror Carmen”, Capela do Morumbi, São Paulo SP
Exposições coletivas
2014
– “Aparição”, curadoria de Fernando Lopes, Galeria Athena Contemporânea, Rio de Janeiro, RJ
2013
– “Por enquanto – Ana Paula Oliveira e Laura Vinci”, Galeria Marcelo Guarnieri, Ribeirão Preto, SP
– “Os Culturofagistas”, curadoria de Mara Castilho e Eva Oddo, Fabrica Asa, Guimraes, Portugal
2012
– “Instável”, Temporada de Projetos, curadoria Douglas de Freitas, Paço das Artes, São Paulo, SP
2011
– “Huasipichay”, Galeria Virgilio, São Paulo, SP
– “Nova Escultura Brasileira – Heranças e Diversidades”, Caixa Cultural do Rio de Janeiro, RJ
2010
– “Ponto de equilibrio”, curadoria de Agnaldo Farias e Jacopo Viscontti Cristeli, Instituto Tomie Ohtake, São Paulo, SP
– “As Trilhas Bifurcadas da Arte Brasileira” (Ponto de Equilibrio), Instituto Tomie Ohtake, curadoria Agnaldo Farias e Jacopo Viscontti Cristeli, São Paulo, SP
– “Incompletudes”, curadoria de Mario Gioia, Galeria Virgilio, São Paulo, SP
2009
– “Iminente, muito próximo então” – Elefante Branco, Casa residencial São Paulo, SP
– “Elefante Branco”, Caixa Residencial São Paulo, SP
2006
– “Paisagem Bruta”, curadoria de Luiz Camilo Osorio, Galeria Virgilio, São Paulo, SP
– 9º Salão Victor Meireles – MASC- Museu da Arte Contemporanea de Santa Catarina, Florianópolis, SC
2004
– “Outro Lugar”, Galeria Virgilio, São Paulo, SP
– “BR2004”, Galeria Virgilio, São Paulo, SP
2003
– “Olho Seco”, Museu de Arte Contemporanea de Ribeirão Preto, SP
2002
– “Extensão”, orientação de Laura Vinci, Espaço 10,20×3,60, São Paulo, SP
– Salão de Piracicaba, São Paulo, SP
– “Maquetes são trabalhos”, Casa de cultura de Sobral, CE
– “Desenhos”, Centro Cultural de Diadema, São Paulo, SP
– CCSP – Coletiva do Programa de Exposições, Centro Cultural de São Paulo, SP
– “Pedra sabão”, Genius Locci, curadoria de Lorenzo Mammi, Faculdade de Sociologia e Politica de São Paulo, SP
2001
– “Papel sobre papel, pedra sobre pedra”, projeto instalação, orientação de Laura Vinci, MUBE – Museu Brasileiro de Escultura, São Paulo, SP
2000
– “Corpó”, Museu do Ingá, Rio de Janeiro, RJ
– “INICIATIVAS”, CCSP – Centro Cultutral de São Paulo, SP
– Edital MACC – Museu de Arte de Campinas, SP
– “Discurso”, MAM – Museu de Arte Moderna de São Paulo, SP
1999
– “Corpó”, Atelie Alexandre Menossi, São Paulo, SP
– “o outro”, orientação de Nazareth Pacheco, MUBE – Museu Brasileiro de Escultura, São Paulo, SP
– “Olho Seco”, Atelie Daora Brandão, São Paulo, SP
Prêmio
2002
– Prêmio Aquisição Programa de Exposições CCSP – Obra incorporada a Coleção de Arte da Cidade de São Paulo, SP
Vídeo produzido pela Matrioska Filmes com exclusividade para o PIPA 2010:
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