(São Paulo, SP)
Até 12 de novembro, a Galeria Jaqueline Martins apresenta Lagoa de Dentro, individual de Adriano Amaral. Marcada por um profundo exame da natureza das coisas que nos cercam e das nossas percepções, a mostra expõe a frágil tensão entre ecologia e tecnologia ao exibir um grupo de esculturas e pinturas desenvolvidas em constante experimentação com elementos orgânicos – água, luz, terra, carvão – e materiais industriais, como o silicone usado para a produção de próteses humanas, alumínio e acrílico.
Confira abaixo trechos do texto curatorial por Germano Dushá:
“É no equilíbrio intuitivo entre contemplação da matéria e manejo radical que se sustenta toda a produção de Adriano Amaral. A partir de disparadores subjetivos e de um estudo minucioso das propriedades formais das coisas e de certos objetos, as questões do artista são levadas a suas últimas consequências em processos laboratoriais, ultratécnicos, que estabelecem associações entre elementos universais — presentes desde os primórdios da humanidade — e materiais e métodos ligados à mais avançada tecnologia. O resultado é a reelaboração do próprio mundo, como o conhecemos.
[…] No que pesem as referências indicadas de modo mais direto e até mesmo figurativo, estas obras vão muito além da mera representação. Elas buscam, em outro sentido, estabelecer pontos de contato com o que uma vez emanou dos lugares, objetos e sensações a que se referem. Funcionam como portais que abrem o universo afetivo do artista.
[…] Portanto, os binômios repetidamente suscitados nesta exposição — orgânico e artificial, energia e matéria, passado e futuro, vida e morte — não são mobilizados a fim de reforçar separações, mas sim para nos provocar acerca do que as reproduz, isto é, as estruturas de nossos sistemas ontológicos e, por que não, cognitivos. Ou seja, surgem para questionar o modo como geramos conhecimento e como isso causa impacto em nossa percepção dos eventos mundanos e, também, extraterrenos.
Adriano Amaral, Sem Título, da série “Pinturas Protéticas”, 2022, acrílico antirelexo, chassi de madeira adaptada, borracha de silicone protética, couro de cabra metalizado, nylon, nanquim, impressão, grafite, pó de ferro. Edição: Unique, 70 x 66 x 6 cm
Se, a todo tempo, o artista opera nesses limites, ele o faz para tensionar os balizamentos pelos quais nos orientamos. Interessado pela reflexão sobre os percursos da conjuntura contemporânea, seu trabalho deixa implícito que não há resposta exata capaz de indicar quando uma coisa se transforma em outra coisa, e é exatamente a concepção desse problema insolúvel que deve nos mobilizar. Da sublimação espiritual, passando pelas alterações atmosféricas, às transições físicas da matéria, o que interessa é o aspecto fluido de tudo, e nosso incontornável destino: transmutar-nos continuamente, a todo instante.
Numa pesquisa que combina rigor técnico e processual com empirismo e intuição, metafísica e mistério com ferramenta e oficina, Adriano costura, cuidadoso, problemáticas maiores com reflexões próprias, sempre num ponto de contato absoluto, tanto emocional quanto corporal. A escolha do título Lago de Dentro sublinha essa ambiguidade cortante de sua obra. Ao passo que remete diretamente a um espaço físico com o qual o artista se relaciona diariamente — e que inspira boa parte dos trabalhos reunidos nesta mostra —, denota também uma ideia ou um sentimento interior. É possível pensar num corpo-d’água imaterial, em que correm os afetos que nos mobilizam, e que nos sustenta desde o nosso âmago.
Aquele que se aproxima de uma ‘lagoa de dentro’ não vê o reflexo do mundo nem o seu próprio. Se ali adentrar, é para submergir com a própria consciência, viver o arrebatamento e deixar-se transformar a partir de si.”
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“Lagoa de Dentro”, individual de Adriano Amaral
De 03 de setembro a 12 de novembro, 2022
Galeria Jaqueline Martins
Rua Dr. Cesário Mota Junior, 443, São Paulo, Brasil
Terça a sexta, das 10h às 19h; sábados, das 12h às 17h
Telefone: + 55 11 2628-1943