Luiza Baldan é a quinta convidada do “PIPA de perto: a artista fala na coleção do Instituto”. Selecionamos, quinzenalmente, uma obra adquirida pelo Instituto e pedimos para o(a) artista comentar um pouco sobre o trabalho: seja o processo criativo; a ideia por trás da obra; a conexão com toda a sua produção ou algum outro aspecto que a pessoa deseje compartilhar. O intuito é aproximar o público do universo do(a) artista e da coleção “Deslocamento” do Instituto PIPA, que foi criado em 2010 para apoiar, ajudar a documentar e a promover o desenvolvimento da Arte Contemporânea Brasileira, e que tem o Prêmio como uma de suas iniciativas. Desta vez escolhemos a obra “Perabé”, 2014-2015, videoinstalação HD, p/b, áudio em 4 canais, 31’10”.
Luiza Baldan (Rio de Janeiro, 1980), finalista do PIPA 2016, é doutora e mestre em Linguagens Visuais pela UFRJ (Rio de Janeiro, RJ) e bacharel em Artes Visuais pela Florida International University (Miami, EUA). A artista investiga dinâmicas urbanas que se estabelecem entre o homem e a arquitetura, a memória e a cidade. Suas imagens e textos resultam da inter-relação com o entorno, numa espécie de performance dilatada pelos lugares onde reside e por onde passa. A imersão é parte fundamental da pesquisa, como ocorre nas residências e nos projetos de longa duração envolvendo viagens e deslocamentos periódicos a locais revisitados.
Confira abaixo o relato que a artista nos enviou sobre a obra, no qual ela explica a ideia por trás do trabalho:
“Das mais de trinta casas onde morei ao longo da vida, a do Copan, em São Paulo, foi a primeira distante do litoral. Um dia escutei que era possível ver o mar sem sair da cidade, em alguma parte ao sul, depois de Parelheiros. Por mais absurdo que pudesse soar, o relato despertou o interesse por encontrar uma paisagem quase fictícia. Assim iniciei o projeto Perabé em dezembro de 2014.
O que a princípio se tratava apenas de encontrar um mirante em São Paulo, se transformou num projeto de travessias, de atravessar a paisagem até chegar à Baixada Santista. Em viagens periódicas ao longo de 10 meses, percorri diferentes caminhos que pudessem conectar a capital paulista ao litoral, coletando as impressões em fotografias e textos. Partindo da Serra da Cantareira, deixei-me guiar por personagens, mitos, histórias e acasos, até chegar ao bairro de Marapé (antigo Perabé), em Santos, que em tupi significa ‘caminho do mar'”.
No vídeo, as imagens são acompanhadas pela declamação de um texto poético escrito por Luiza. As vozes são feitas por Daniel Roland, Domingos Guimaraens, Luiz Mors Cabral e pela própria artista, que disponibilizou o texto completo em seu site. Confira um trecho inicial:
“Uma cidade ajuda a ler outra cidade. Cidade é lugar de memória. Para os viajantes, a cidade natal é a casa que se carrega na mala para facilitar a chegada em um lugar desconhecido.
A minha cidade natal é o mar. Em qualquer saudade, em qualquer sonho, em qualquer pesadelo, o azul é o que se vê e a maresia é o que se sente. Onde eu nasci tem mar. Para onde eu mudei tem mar. E em cada porto que atraquei, deixei um pouco do porto de partida.
Então a casa é mar, em sua maleabilidade e insistência. As águas se contaminam, se comunicam, levam e trazem. Ainda crianças, quando mal sabemos ler a cidade, a escala das avenidas e prédios assusta. O mar intimida. Somos seres diminutos cercados por grandes massas e volumes que desde cedo nos ensinam sobre hierarquia e o viver em sociedade. Conforme crescemos, a cidade também cresce, mas a percebemos menor.
O mar é o único que não muda com o tempo.
Todas as cidades em que morei têm mar, menos uma. A cidade sem mar é a única que não para de se agigantar”.
Para ler o texto na íntegra, clique aqui.
Assista, abaixo, à obra “Perabé”: