Mariana Casagrande e Alexia Carpilovsky, da equipe do Prêmio PIPA, conversam com Panmela Castro no terceiro episódio da segunda temporada do PIPA Podcast. A artista fala sobre o início da carreira e sobre sua relação com a rua, que a levou a ser considerada “rainha do grafite brasileiro”. Panmela também estende o conceito de arte urbana em seu trabalho para as intervenções e performances, e aborda os projetos de arte e direitos humanos criados para atender mulheres negras e de periferia, como a Rede NAMI.
“Meu interesse na rua veio das questões de alteridade. Da necessidade de ser aceita pelo outro, estar com o outro e falar com o outro”.
Ouça agora o episódio aqui no site ou acesse nas plataformas de streaming, como Spotify e Apple podcast, além do nosso canal Prêmio PIPA no Youtube.
Os episódios do podcast estão sendo gravados remotamente, por meio de videoconferência. Abaixo, você pode conferir as referências que são feitas durante a conversa.
R E F E R Ê N C I A S
- Femme Maison
Panmela pintou em 2017, para a 2ª edição de Frestas – Trienal de Artes do Sesc, um mural chamado “Femme Maison” em Sorocaba, no Palacete Scarpa, antigo prédio tombado pelo patrimônio histórico municipal e atual sede da Secretaria de Cultura e Turismo da cidade. A obra consistia na imagem de duas mulheres unidas por um terceiro olho adornado pelo o que a artista chama de “Flôr”, uma flor-vaginal, e gerou comoção e incômodo, inclusive por parte de políticos. Desfecho: o mural foi apagado algumas semanas depois de ser feito.
Heloisa Buarque de Hollanda, para sua pesquisa sobre feminismos contemporâneos, convidou Panmela para escrever sobre a obra. Você pode conferir um trecho do texto abaixo:
“Pela primeira vez, essa criação sofreu, ao meu entender, ataques violentos de misoginia: criou-se uma polêmica na mídia, internet, ruas e universidades sobre o fato de haver uma ‘genitália feminina tamanho gigante pintada em um prédio público tombado’, palavras usadas pelo vereador Pastor Luis Santos (PROS) em sua fala contra o graffiti na câmara dos vereadores”.
O vereador chegou a protocolar um requerimento solicitando à prefeitura a remoção da pintura do prédio.
Para ler o texto “A Misoginia e a Obra Femme Maison para o Frestas” na íntegra, clique aqui.
- Art Basel Miami Beach
Este foi outro episódio de censura sofrida por Panmela Castro que teve repercussão. A artista estava em Miami para o Art Basel Miami Beach, um importante evento de arte que acontece todo ano na cidade, e foi convidada para pintar um mural em Wynwood, bairro conhecido por comportar diversos graffitis. Abaixo, reproduzimos o relato de Panmela feito em 3 de dezembro de 2019, no Instagram, sobre o ocorrido:
“Estou aqui em Miami para a Semana de Arte. Além da feira principal, a Arte Basel Miami Beach, existem outros projetos que atraem a atenção do público, como o bairro de Wynwood que ficou famoso por seus murais de grafite e onde eu fui convidada para pintar um novo mural. Com o apoio das pessoas envolvidas, decidi por colocar na parede uma pintura do projeto #RetratosRelatos onde mulheres me enviam seus relatos de vida junto à uma foto e eu as retrato. Decidi então pintar o relato de uma de minhas alunas da Rede NAMI.
O relato veio junto à uma matéria de um jornal O Globo que contava sobre uma passagem em que esta minha aluna, filmou o abuso de policiais à alguns jovens na Rocinha, e que com isso teve o celular quebrado, foi agredida e presa. Ontem eu iniciei a pintura usando como referência a foto do Jornal, e junto a isso, me apropriei de uma frase que dizia ‘Mulher Que Filmou Abuso de Policiais é Agredida e Presa’ e escrevi na parede.
Na parte da noite, recebi uma mensagem avisando que o dono da parede recebeu reclamações da polícia que protege o local e que não queria arrumar problema com eles, sendo assim, eu deveria apagar a frase. Hoje o mural foi pintado de preto.
O curioso de tudo, é que a pintura é justo uma crítica ao abuso de poder por parte de alguns policiais que agora, através desta censura, limitam meu direito à expressão, e reafirmam que a violência institucional destes que deveriam estar aí para nós proteger, por sua vez nos oprimem, e nos obrigam a nos calar.
Debater sobre temas que me afligem e colocar em pauta infrações contra os direitos básicos dos cidadãos deveria ser algo visível em um país democrático. Mas parece que a democracia se fragiliza não no Brasil, mas em outros lugares também.
Em 2017 o meu Mural Femme Maison pintado no Brasil foi perseguido e censurado, fomos processados, e o mural que deveria ser permanente acabou sendo apagado em algumas semanas. O caso ganhou repercussão nacional. Eu sabia que isso poderia voltar a acontecer no Brasil, mas nunca imaginei que poderia acontecer em um país como os Estados Unidos onde as instituições não são frágeis como as brasileiras, mas aconteceu”.
- Foto por Alexandre Abade (encontrada no portal do The Guardian)
- Foto por Gabriel Montenegro (encontrada no portal do The Guardian)
O episódio foi assunto de uma matéria no site do jornal britânico The Guardian, e, na época, fizemos uma postagem aqui no site do Prêmio PIPA. Para ler o post, clique aqui.
- Rede NAMI
Uma organização que luta pela equidade de gênero por uma sociedade sem violência contra mulheres. Em seu site, a NAMI é descrita da seguinte forma:
“A Rede NAMI é uma ONG formada por mulheres, de direito privado, sem fins lucrativos, e tem como principal finalidade o uso da arte como veículo de transformação cultural positiva através da promoção dos direitos das mulheres em específico pelo fim da violência doméstica. Surgiu em 2010, registrando-se formalmente em 2012, pelo desejo de sua fundadora, Panmela Castro, em contribuir para o fim da violência contra a mulher e fomentar o protagonismo de mulheres nas artes”.
A missão é definida como “multiplicar o empoderamento de mulheres sobre os seus direitos através das artes urbanas”.
A artista, que foi vítima de violência doméstica, trabalhou para ajudar na promoção da Lei Marinha da Penha, aprovada em 2006. Como informado no portal da NAMI, Panmela “Desenvolveu uma metodologia especial para usar o graffiti como ferramenta de comunicação sobre a Lei e finalmente, em 2008, realizou o projeto Grafiteiras pela Lei Maria da Penha, pela organização de Direitos Humanos da Baixada Fluminense: ComCausa. Em 2010, depois de ser homenageada pelo Vital Voices Global Leadership Awards, criado pela organização fundada pela até então primeira dama dos Estados Unidos, Hillary Clinton, percebeu o quão importante era seu trabalho e decidiu fundar sua própria organização”.
Entre as ações da NAMI, está o projeto “AfroGrafiteiras”, projeto de formação em arte urbana focado na expressão e promoção do protagonismo de mulheres afro-brasileiras, em atividade desde 2015. No site da NAMI, encontra-se escrito: “Neste projeto oferecemos ferramentas para que mulheres negras possam expressar através da arte assuntos cruciais em suas vidas e seus pensamentos para a sociedade, em contraponto à maneira como vêm sendo representadas pelos meios tradicionais”.
Para saber mais sobre a ONG e suas atividades, visite o site aqui.

Imagem retirada do portal da NAMI: Malala visita a organização e escolhe o stencil da Marielle para grafitar no Museu Vivo da Rede NAMI
- Manual “Hackeando Poder: Táticas de Guerrilha para Artistas do Sul Global”
O livro, que está sendo feito pela equipe da NAMI, reúne o conhecimento desses anos de trabalho da organização e tem como objetivo, segundo publicação na página de Facebook da ONG, que “mais mulheres se interessem por serem artistas, e também aprendam de forma simples técnicas básicas sobre como se colocarem nesse mercado opressor e excludente. Além disso, o livro conta com convidadas para falar sobre suas histórias de guerrilha na arte”. Entre as convidadas estão Keyna Eleison e Amanda Carneiro. Os livros terão parte vendida nas livrarias e parte distribuída gratuitamente para artistas periféricas.
- Série “Vigília”
Em seus canais, Panmela Castro define a série da seguinte forma “A série de pinturas Vigília são retratos-memória de uma noite performática em que comemos, bebemos, dançamos e ficamos juntos”. A série surgiu com a flexibilização da quarentena em 2020 como uma forma de “ir além da sobrevivência”, segundo ela.
Abaixo, um registro do artista Moisés Patrício participando da série.