(São Paulo, SP)
A Adelina Galeria recebe a exposição “16.02 I 27.09 l 19.10l Curitiba: a coisa em si”, que traz oito trabalhos da artista Tatiana Stropp. Pintando em chapas de alumínio lisas, a artista apresenta pinturas que dão continuidade à sua investigação em torno das cores e da luz, mas agora experimentando novos tamanhos e introduzindo outras texturas, relevos e ruídos.
A artista, que sempre usou chapas de alumínio com algumas dobras -conferindo certo caráter escultórico às pinturas- começa agora a introduzir novos elementos que ativam ainda mais o suporte, reforçando sua materialidade. O suporte em alumínio, segundo o curador Paulo Gallina, reforça que a pesquisa de Tatiana vai muito além da pintura. “Tratando-se de uma técnica histórica, a pintura que estamos comentando inova na base que recebe o pigmento e a emulsão. A artista cria sobre telas de alumínio, recortadas e dobradas antes do processo em pintura iniciar-se. Esta subversão retorna ao espaço tridimensional uma técnica que anula a notação da perspectiva falseada dos italianos do século XV. A dobra no suporte é também uma linha, atravessando a superfície pictórica”, explica.
Leia na íntegra o texto curatorial de Paulo Gallina para a exposição:
16.02|27.09|19.10|Curitiba: A coisa em si ou O mundo sem vontade de representação
“Algo digno de nota na produção recente de Tatiana Stropp é sua capacidade de apresentar uma pintura por si. Livre da oposição entre a figuração e a abstração, a pintora constrói imagens através da relação entre as cores. Como o azul associa-se ao matiz laranja? Ou ao cinza? Como o lilás toca o vermelho? Perguntas abstratas a maioria dos observadores e partes da resposta procurada pela artista curitibana.
A técnica impera na discussão: sem notar-se a sutileza do método, não é possível compreender o que a artista realmente busca. Uma vez que a pintora não está pesquisando como as cores se misturam – elaborando outras tonalidades –; a imagem de suas pinturas é a desconstrução da ilusão de perspectiva mimética. Não há um reflexo de mundo para apreciar-se nos trabalhos de Tatiana Stropp, há uma pintura reveladora de seus materiais e processos.
A linha, por exemplo, é um elemento desta pesquisa merecedor de alguma ponderação: As cores e suas tonalidades organizam-se na repetição linear de áreas coloridas. A irregularidade da mão que controla os largos pincéis é mais ou menos clara. Poucas vezes a artista se utiliza da ajuda de máscara na construção de suas linhas. Este dado corriqueiro, em verdade é revelador de que a pesquisa sensível não atravessa o escopo cientifico em sua vontade de mesurar ou equalizar o que é naturalmente irregular.
Ao fim, a leitura da obra de Tatiana Stropp é reveladora de um estudo sobre a natureza das cores, atravessadas pela percepção cultural de nosso presente. Afinal, ao invés de falsear uma suposta objetividade, a artista aceita a subjetividade de seu tempo para obter as conclusões que ela é capaz de apreender de seu estudo. Ao contrário do discurso jornalístico ou científico, os quais entregam suas conclusões em manifestos ou tratados, a pintora provoca ao público com pinturas capazes de incitar as perguntas que deram forma à série de trabalhos. As relações colóricas pesquisadas por Tatiana são de conhecimento público, porque estão plasmadas em suas pinturas; conquanto as respostas exigem dos observadores o contato epidérmico com a imagem. Em tempo, o olhar começa a dissecar o que vê, a separar o que é um recurso técnico necessário à forma e o que é um recurso técnico revelador de conteúdo discursivo.
Notadamente, conhecer o histórico de produção da artista revela com maior clareza onde estão as premissas plásticas e teóricas na obra de da pintora curitibana. A superfície, sem dúvida, é uma pesquisa relevante na trajetória da artista. Ao estudarmos as composições anteriores a fase apresentada nesta exposição, perceberemos como o recorte entre a superfície e as faixas de aplicação de tinta dentro das tradições em pintura formuladas na Europa depois da primeira guerra mundial. A pintura pós-moderna com sua vocação em revelar o suporte e integrá-lo à imagem foi ponto de partida nos anos dedicados à compreensão da pintura. Nesta produção recente, entretanto o suporte começou a ganhar formas, dobras que fazem a superfície avançar pelo espaço e retornar à tridimensionalidade, negada pela imagem, ao estudo da pintura. O suporte, transformado em objeto espacial, também revela-se ao observador na diluição das tintas, elemento que destaca a função da luz na percepção da cor.
Tome-se como exemplo a pintura 16.02. A composição, formada por duas peças com áreas sobrepostas, aproxima-se de características do espaço – por exemplo volume e sombra – para compor à natural bidimensional inerente a pintura. Se a cor esta aplicada planarmente sobre a superfície, a incidência de sombra altera a tonalidade percebida pelo olho. Ao explorar o espaço tridimensional, a pintura inaugural da pesquisa não se permite fingir um espaço falseado com altura, largura e profundidade; reiterando pelas cores apresentadas linha a linha as inescapável bi-dimensionalidade de toda pintura.
A subversão na peça 16.02 advém do fato de que a imagem, aquilo que representa, nasce na sobreposição de tintas e das peças, as quais criam interferências entre si. Se a base sobreposta projeta sombra e cor na parte próxima a parede, esta por sua vez define o ritmo do olhar capaz de tomar a peça. De pronto, Tatiana Stropp transforma seu trabalho em uma pintura capaz de operar áreas e espaços sem negar a planaridade da pintura. Como se fosse possível sobrepor infinitos planos cartesianos para formar um espaço tridimentsional que é pura potencia, porque não está limitado por leis naturais. E, neste contexto de imagens, o vermelho poderia significar tanto quanto a esperança ou a igualdade.
Para além do meandro em pintura, a presença de suporte inesperado revela algo também sobre a proposição de Tatiana Stropp. Tratando-se de uma técnica histórica, a pintura que estamos comentando inova na base que recebe o pigmento e a emulsão. A artista cria sobre telas de alumínio, recortadas e dobradas antes do processo em pintura iniciar-se. Esta subversão retorna ao espaço tridimensional uma técnica que anula a notação da perspectiva falseada dos italianos do século XV. A dobra no suporte é também uma linha, atravessando a superfície pictórica. Uma linha como são as cores, mas com a potência de rasgar a ilusão de imagem e retornar ao objeto e à imagem seu estado natural. Sem querer representar, as entidades dentro da pintura de Tatiana Stropp são também invasoras no mundo das selvas e pedras, porque como o pensamento humano são pura dúvida e sensação viva.”
“16.02 I 27.09 l 19.10l Curitiba: a coisa em si”, individual de Tatiana Stropp
Curadoria de Paulo Gallina
Em cartaz de 16 de novembro até 13 de janeiro de 2018
Adelina Galeria
Rua Cardoso de Almeida, 1285 – Perdizes
Funcionamento: ter – sex, 10h às 19h; sáb, 10h às 17h
T: (11) 3868-0050
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